quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Pérolas aos porcos?

Pérolas aos porcos?

Estamos vivenciando uma grande expansão imagética. O modo de produção artístico nunca se aproximou tanto das massas.

De 1839 a um distante 1888, muitos artistas-inventores mergulharam no desconhecido mundo fotográfico, um mundo tão caro quanto excêntrico. Foi apenas no já dito 1888, que George Eatsman kodaqueou o tão famoso “you press the button and we do the rest”. Não há muitos relatos subjetivos de tal (r)evolução para contar história – a maravilhosa blogosfera ainda levaria mais de século para nascer. Podemos apenas imaginar o que corria nas bocas dos especialistas e o que explodia nos corações de quem teria uma nova oportunidade.

As máquinas fotográficas rapidamente deixavam de pesar quilogramas ao quadrado e se tornavam mais portáteis e – o mais importante! – acessíveis. Até então, a fotografia era linguagem de ricos e especialistas, um capricho de inventores e afixionados pelo novo. Ao mesmo tempo que acessível e compacta, a fotografia se tornava alvo e interesse de muitas pessoas. Afinal, um modo de produção imagética instantâneo haveria de conquistar os corações de todos.

É por volta desse período que temos o surgimento de um movimento deveras importante na história da fotografia, o Pictorialismo. Em poucas e injustas palavras, o Pictorialismo se definia como defensor do caráter artístico da fotografia (havia, na época – e quem sabe até hoje! –, uma grande discussão se a fotografia deveria ser encarada apenas como documento, como mimese, ou como uma forma de expressão, como arte). Seja pelo processamento complicado, pelas composições similares às da pintura, pelas técnicas de singularização do negativo, o Pictorialismo tentava negar a reprodutibilidade e caráter de documentação que eram inerentes à fotografia naquela época.

Não digo que uma coisa é conseqüência da outra – o acesso facilitado à fotografia e o Pictorialismo. Mas creio que alguma ligação deve ter havido.

E agora chego ao pensamento principal contido nesse amontoado de palavras: o que dizer dessa “popularização” da fotografia? Seria dar pérolas aos porcos?

Digo essas palavras enquanto faço uma careta – parece-me elitista e egoísta querer reservar um tipo de processo a um certo tipo de pessoa. Creio que o aumento da acessibilidade tenha sido fundamental para o desenvolvimento da fotografia em seus vários aspectos, documental, artístico e filosófico. O Pictorialismo, por exemplo, sucumbiu ao Modernismo fotográfico, munido de diversas vertentes espalhadas pelo mundo inteiro. E esse fato se deu, entre outros motivos, pela popularização do instrumento fotográfico.

Obviamente, nesse caso, o maior e mais fácil acesso semeou um futuro melhor para a fotografia.

Anos passam, guerras se criam e se desfazem, morre John Lennon, Bill Gates fica rico, o All-Star entra na moda, o All-Star sai de moda e é criada a fotografia digital. Então o All-Star entra na
moda novamente.

Um mundo de possibilidades se abre na fotografia: o simples fato de se descartar os gastos financeiros corriqueiros (apesar do alto investimento inicial) e a espera pelo resultado – fetiche fotográfico amansado pelo advento polaróidico – tornou a fotografia digital tão fascinante e tentadora que o número de máquinas fotográficas foi crescendo absurdamente. Modelos novos são lançados, memórias mais rápidas, mais controles, maior resolução, detector de sorrisos... E isso sem falar na invasão fotográfica que sofreram os aparelhos de telefonia móvel.

Não é preciso salientar que o acesso à fotografia, uma vez mais, se torna facilitado.

A fotografia se tornou presente e necessária em qualquer evento. O especial, que antigamente era gravado em película, hoje se aglomera ao corriqueiro gravado no sensor compacto.

Não quero entrar aqui no mérito do fotográfico ou até mesmo do fotografável – há ainda muita água a correr nesse rio. Mas o que interessa agora é a procura por um maquinário cada vez mais especial e que possa proporcionar um avanço no aprendizado, que pode ser relativo a um hobby e até evoluir para a profissão.

E no meio disso tudo, as DSLR (Digital Single Lens Reflex), máquinas consideradas semi e profissionais, mostram o maior aumento de vendas no setor fotográfico. Teríamos aqui, talvez, uma maior especialização do consumidor? Ou apenas pérolas aos porcos?

Em sua nova busca por mais informações e mais tecnologia, o nosso consumidor de base evoluiu a um consumidor médio. Já o consumidor médio, pulou uma posição no pódium, e começa agora a se aventurar nos conceitos profissionais da fotografia.

Talvez ainda seja cedo demais para chegar-se a alguma conclusão sobre esse novo boom de equipamentos fotográficos se não profissionais, mais sérios. Há pontos positivos e pontos negativos, obviamente.

Temos uma maior demanda no setor de compra: produção, pesquisa e desenvolvimento precisarão acompanhar. Porém, o mercado de trabalho é inflado. A pequena possibilidade de transformar um hobby em fonte de renda parece tentadora aos olhos de qualquer um. Possíveis resultados: um rápido sucateamento do mercado de trabalho; os novos “profissionais” desvalorizam o próprio trabalho a fim de penetrar num mercado complicado e bem definido. Em outras pequenas e egoístas palavras, qualquer um se torna “capaz” de realizar um trabalho fotográfico.

Examinando a situação com outros olhos, a fotografia muito tem a ganhar com essa super-exposição que anda ganhando nesses últimos anos. Muitas pessoas passaram a se interessar pelo ato fotográfico – e não só pela fotografia fisicamente dita. Temos um crescendo de apertadores de botão que descobrem a fotografia como arte, como expressão – e se tornam fotógrafos. A arte fotográfica ganha mais espaço: mostras, museus, palestras, feiras, convenções, leilões, cursos, faculdades, teses, concursos.

Talvez por sua linguagem ser facilmente apropriável, a fotografia só tem a crescer em números de usuários – aqueles que fotografam regularmente por hobby, os que a tem como profissão ou os que fotografam a festinha de 5 anos do afilhado. Na balança final, os prós e contras disputam a unhas e dentes pra qual lado penderá a mudança que a fotografia digital proporcionou. Mas ainda há muito a ser clicado sobre esse assunto. E como os cartões de memória são contados em gigabytes agora, ainda veremos muitas fotos sobre esse assunto por aí.

Fecho as minhas mil palavras com muitos pensamentos não ditos. Talvez seja necessário fotografar mais e pensar menos. Ou não.

3 comentários:

neferthais disse...

Sua nova proposta de blog propõe uma reflexão, então vai. É foda pensar nisso. Querendo ou não, o cara mais fudidão e velho no mercado deve sentir um pingo de ódio de nós que queremos começamos na fotografia. E nós, em nosso ilustre anonimato, esbravejamos contra a galera que compra uma SLR e se acha fodão. Acho que no fim, será como nas outras artes: haverá o funilamento do mercado e a valorização do profissional completo. Até aí, tem q rolar uma valorização da fotografia pela própria sociedade. Acho que um exemplo legal é comparar as fotos do Peter Parker com as do Libélula. Acredito que estamos num período obscuro para a fotografia, mas ao mesmo tempo bem perto da iluminação.

caio paganotti disse...

a-há! concordo com a senhorita! mas quem será esse valorizado profissional completo? é o cara q tinha mais grana pra investir, então comprou máquinas e lentes caríssimas? ou é aquele que fez um curso técnico ou fauldade de fotografia? ou é aquele apaixonado pela fotografia, que estudou pra caramba, conhece quase por completo esse tipo de linguagem, mas não tem mto dinheiro e fotografa com uma câmera pobrinha?

acho q aí ainda temos mto pano pra manga. como valorizar um profissional q não sabemos bem como descrever?

neferthais disse...

resultado final?

pra mim não importa o qto vc sabe, ou o qto tem de grana, importa o resultado final, a revelação!

mas... quem valoriza? sim, dá muito pano pra manga